sexta-feira, maio 16, 2008

Mutante Calado


Histórico saudosista, Carlos Calado é fã do trio Mutantes. Seu livro não é uma descrição completa da saga mutante, mas é uma pesquisa essencial para chegar mais perto dos dias em que Mutantes dominavam a terra. Anos em que o experimentalismo era de fato original e que o resultado não era uma tortura apresentada apenas à amigos.
Amizade, aliás, era o que unia esse grupo. Talvez fosse a criatividade. Sem dúvida foi a coragem. Enfim, independente do que unia, o resultado é que Sérgio, Arnaldo e Rita conseguiram uma conexão cósmica capaz de produzir algumas das músicas de rock mais impactantes já feitas no Brasil. Músicas, aliás, ainda elevantes, relevantes e impactantes.
Os Mutantes sabiam o que faziam, como faziam. Não se levavam a sério, aproveitavam seus momentos criativos com gosto e alegria. O humor, os elos, as pesquisas, e sobretudo a vontade e preocupação de fazer algo realmente próprio; de apresentar músicas como eles pensavam, como queriam, mandando às favas qualquer lógica ou preceito.
O livro termina com a esperança de que esse grupo volte a tocar. Demorou mais dez anos depois do livro ser originalmente lançado. Mesmo assim, sem a vocalista original nos microfones. E Carlos Calado faz com que mais um entre para sua torcida. Depois de saber detalhes de um grupo que enfrentou multidões em festivais para apresentar um sonho tão esquisito como apaixonante, é difícil não ficar na torcida de sua volta e numa nova sacudida na cultura atual.

quarta-feira, maio 07, 2008

Virada Cultural 2008


Virada Cultural 2008, originally uploaded by Daniella Gomes.

A determinação espacial na definição cultural é a chave para criar a complexidade de referências e profundidade de sensibilidades.
De sábado, 26, à domingo, 27, aconteceu uma das maiores manifestações culturais simultâneas da paróquia.
Não foram só varios shows montados para vender ingresso e bebidas a preços exorbitantes (sem entrar no mérito de ser um evento organizado pela prefeitura em ano eleitoral).
Foi um mergulho. E diferente de entrar num tonel de água ou tinta, materiais que sabemos o que vai acontecer ao meter a cara, não tinha como prever como seria passar essas horas no centro de São Paulo.
Os shows eram mais previsíveis. E funcionaram com uma precisão invejável.
Mundo Livre S/A e Vanguard foram esquentas. Distantes, nada marcante. Talvez pelo palco, pelo horário ou empolgação.
Disso prum gigante que empolgou e comoveu. Gal gritou, pulou, e deixou o clima super caseiro. Mestre, a seleção musical foi cantada com gosto de quero mais. Costa causou tumulto e teve um dos momentos de maior público de toda a virada. Furtos de celulares à parte, um show que só o cruzamento entre a São João e Ipiranga pôde conceder.
A Balada Silenciosa foi coisa pra paulistano ver. A idéia foi tão interessante que todos foram conferir. Pra quem tava zappeando, só restou a imaginação de quais sons faziam a pista.
A Virada das Vampiras foi outra surpresa de público. Os ingressos acabaram e não deu pra ver o filme das 2h, cuja bilheteria ficou sem os tickets de entrada uma hora antes!
Os quadrinhos criados, desenhados, pintados e artefinalizados "num aquário", ao vivo e à cores foi hipnotizante. Com viagens desnecessáras contra o talento assustador de diferentes roteiristas. Destaque para o A4 de Laerte. Simples, puro. Detonou.
Mutantes já no palco, e a correria para ouvir que eles continuam meio desligados. Não só isso, mas completamente alucinados e poderosos. Se a idéia de velhice não alterou os dedilhados dos Stones em Copacapana, aparentemente também não influenciaram os loucos daqui. Não consegui ver quem era a vocalista da vez, que não foi nem um pouco original e seguiu a cartilha sem surpresas. Mas o restante da trupe, visivelmente alucinados de alegria, estava criativa e transendental. Muito mais que o público, por sinal. Algumas músicas não eram familiares, pelo que percebi, novas. Terminaram com mantra raivoso, tropicalista e quase epilético contra as pessoas da sala de jantar. Merecido. Foram responsáveis pela música-chave da Virada, que encheu muitos olhos: a Balada do Louco. Eles insistem em serem felizes.
Novamente a sala com Vampiras lotou e perdemos as garotas das 4h.
Sambas, pessoas dormindo com mendigos e dividindo cobertores de papelão, pessoas fantasiadas, darks estranhando tanto movimento, policiais cansados e procurando formas de se manterem
acordados. O clima das 5h era frio, mas o público insitia em perambular pelas ruas. Um exército de zumbis involuntários procurava o melhor caminho para a próxima atração. Alguns desses faziam trajetos com o dedo num guia de bolso, outros preferiam ficar horas encarando uns totens gigantes, tentando entender o mapa ou a programação.
Depois de uma pizza individual por 3 reais (que jurava ser R$ 2,50 minutos antes), enfrentamos as Vampiras. A indicação era do Carlão, cujo blógue está aí do lado há anos. E superou as expectativas, de novo. Alucarda é o entontro de Carrie com Exorcista. Por mais que o conforto da cadeira roubasse alguns momentos de cochilo, o drama da garota num convento bizarro e sua amizade com Alucarda, é um deleite visual.
Sua sinópse revela muito: They gave their souls to Hell... but the Devil wanted MORE! Para rever.
Temendo a luz do sol, saímos à procura de mais sons. Na presença de outros seres estranhos, Quasímodo fazia com que alguns perdidos bêbados pulassem empolgados no Baile do Arouche.
Na sequência, no palco principal, uma multidão esperava o Teatro Mágico. Trupe circense. Músicas que todos na platéia, majoritariamente crianças, cantavam com emoção. Um show de imagens, articulações, sons e efeitos. Mas música fica em segundo plano, e as poesias tratam do amor de duas pessoas como arroz e feijão.
Já tonto, procurei uma padaria prum café, que foi encontrada no Copan. Logo Malu Magalhães entrou no palco das meninas, em frente onde saboreava um folhado.
Indiezinha, a aposta do myspace foi simpática. Sem controle nenhum da situação (foi instruida diversas vezes pelo namorado vanguardista durante a apresentação, mudava de tom, ritmo e melodia sem propósito). Renato, que me acompanhou na Virada, estranhou o repertório folk norte-americano, um tanto deslocado com o restante das atrações.
Depois de experimentar o famoso sanduíche de mortadela do Mercadão, sobrou apenas alguns acordes de uns índios que se expressavam na porta do Mercado Municipal. Mas, depois de 20 horas de natação em som e imagens, não entendia mais o que acontecia.
No final eram só pernas doloridas e a cabeça fervendo de idéias.